Correndo em direção ao mar

Correndo em direção ao mar

terça-feira, 13 de abril de 2010

Homenagem

Antes ele era confuso. Confundia tudo. Alhos e bugalhos. Levou um tempo e algumas tormentas para que ele percebesse a límpida realidade.
Antes, ele escrevia coisas imundas:
"Eu não sabia, você não sabia. Nós não sabiamos ver as coisas como elas são. Mas eu vi. Vi que você não passava de uma farsa e eu, eu não passava de uma ilusão."
"Sinto, mas minha tristeza antecede aquele inesperado encontro e nada tem haver com ele. É terrível sentir-se tão triste que se tem vergonha de ver qualquer pessoa que seja. Quanto à delicadeza das atitudes, entenda como um desabafo impessoal de alguém cansado de ser tão generoso com o mundo a ponto de só sangrar. Só preciso ficar só para sangrar em paz. Em seguida, volto a ser a velha alegoria de carnaval."
Um dia, como que numa vertigem, suas mãos urraram:
"E seja qual for o futuro, que ele seja branco."
Ele, pretensioso acerca de seus sentimentos, supunha entender o vulcão de signos contido nesta curta sentença. Mas ele era tolo. Não entendia nada. Foi preciso rasgar seu coração a foice e deflorar todo seu jardim de sentimentalidades para que ele começasse a suspeitar de sua grande insignificância frente às coisas simples, porém grandiosas, da vida.
Foi necessário mergulhar no hiato da existência.
E quando ele começou a se dissolver na mudez do seu porco coração, percebeu repentinamente que achava até prazeroso ter um coração tão sujo, e não queria mais limpeza nem perfume nem clareza nem paz. O que ele queria, era uma sujeira branca.
E hoje é o que ele tem, um coração porco, mas branco. E que não mais aguarda pelo futuro. Implode seu presente e, das ruínas, ergue seu destino.
Cinnamon

Um comentário:

  1. "Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse sempre a novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias"
    Clarice, sempre Clarice...

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